26 fevereiro 2015

DIRETRIZES DE ATENÇÃO À REABILITAÇÃO DA PESSOA COM SÍNDROME PÓS-POLIOMIELITE E CO-MORBIDADES.




METODOLOGIA DE BUSCA E AVALIAÇÃO DA LITERATURA.
Foram consultados os referenciais teóricos e da prática clínica no país. A pesquisa teórica deu-se nas bases de dados: Medline, LILACS, Cochrane Database of Systematic Reviews, CINAHL (Cumulative Index to Nursing and Allied Health Literature), Web of Science, PubMed e PEDro utilizando como palavras-chave: “Síndrome Pós-Poliomielite”, “Síndrome Pós-Pólio”, “Poliomielite e Síndrome Pós-Poliomielite”, “sintomas tardios da Poliomielite”, “fraqueza muscular”, “marcha”, “dor pós-polio”, “dor muscular”, “fadiga”, “funcionalidade”, “órteses”, “qualidade de vida”, “intolerância ao frio”, “alteração do sono”, “problemas respiratórios”, “disfagia”, “disartria”, “problemas de memória”, “ansiedade”, “depressão”, “fisioterapia”, “reabilitação”, “Post Pólio Syndrome”, “Post-Polio Syndrome”, “Postpolio Syndrome”, “Polio and Post Polio Syndrome”, “Late simptoms of polio”, “Late effects of polio”, “muscle weakness”, “gait”, “Walking”, “Postpolio pain”, “muscle pain”, “fatigue”, “functionality”, “orthoses”, “quality of life”, “cold intolerance”, “sleep disturbance”, “respiratory problems”, “dysphagia”, “dysarthria”, “memory problems”, “recente memory”, “anxiety”, “depression”, “physiotherapy”, “physical therapy”, “rehabilitation”. As buscas foram feitas sem restrição de ano, em língua inglesa e seu correspondente em português. O referencial da prática clínica baseou-se na expertise de equipe multidisciplinar da UNIFESP, pioneira na pesquisa e atendimento da SPP no país.
OBJETIVO
O objetivo desta diretriz é oferecer orientações às equipes multiprofissionais para o cuidado à saúde da pessoa com Síndrome Pós-Poliomielite nos diferentes pontos de atenção da Rede de Cuidados à Pessoa com deficiência.
Espera-se que as Diretrizes de Cuidado à saúde da pessoa com Síndrome Pós-Poliomielite contribua para a construção, mensuração e a manutenção de sua saúde plena, bem como o desenvolvimento da sua autonomia e desenvolvimento social. Deseja-se em última análise que o trabalho dos vários profissionais de saúde em conjunto com a comunidade se concretize em uma vida digna, saudável e plena.
INTRODUÇÃO
POLIOMIELITE
Erradicada no Brasil desde 1989 (último caso registrado no país), a poliomielite é uma doença infectocontagiosa aguda, causada por um vírus que vive no intestino, denominado Poliovírus. Embora acometa com maior frequência crianças, pode ocorrem também em adultos.
O período de incubação da doença varia de dois a trinta dias sendo, em geral, de sete a doze dias. A maior parte das infecções apresenta poucos sintomas (forma subclínica) ou nenhum e estes são parecidos com os de outras doenças virais ou semelhantes às infecções respiratórias como gripe - febre e dor de garganta - ou infecções gastrintestinais como náusea, vômito, constipação (prisão de ventre), dor abdominal e, raramente, diarréia. Cerca de 1% dos infectados pelo vírus pode desenvolver a forma paralítica da doença, que pode causar sequelas permanentes, insuficiência respiratória e, em alguns casos, levar à morte. Em geral, a paralisia se manifesta nos membros inferiores de forma assimétrica, ou seja, ocorre apenas em um dos membros. As principais características são a perda da força muscular e dos reflexos, com manutenção a sensibilidade no membro atingido.
SÍNDROME PÓS-POLIOMIELITE (SPP)
Síndrome Pós-Poliomielite (SPP) é uma doença do neurônio motor de caráter degererativo e progressivo. Embora não se conheça totalmente a etiologia, a causa mais aceita é a degeneração das unidades motoras remanescentes, algumas gigantes (grande número de fibras musculares inervadas pelo mesmo neurônio motor), formadas após a fase aguda da poliomielite. A SPP é definida por um conjunto de sinais e sintomas que ocorrem, geralmente, após 30 a 50 anos, no mínimo 15 anos após a infecção aguda da poliomielite. Caracterizada, principalmente, por três sintomas principais: nova fraqueza muscular, fadiga e dor.
A nova fraqueza muscular, afeta geralmente os músculos previamente mais comprometidos, mas também pode afetar a musculatura aparentemente normal, estando acompanhada ou não de fadiga e dor muscular e/ou articular.
Outros sintomas que podem estar presentes são: nova atrofia muscular; disfonia; disfagia; insuficiência respiratória; transtorno urinário e fecal, transtornos do sono associado ou não de cefaleia matinal; aumento de peso corporal; intolerância ao frio; ansiedade; depressão; problemas de memória.
Tipos de SSP:
Pelo fato dos critérios diagnósticos incluírem diversos sinais e sintomas, os subtipos de SPP têm sido propostos, mas no último consenso de 2000, ficou estabelecido que não existe base suficiente para uma classificação específica.
NOMENCLATURA
Alguns termos foram propostos para denominar os novos sintomas observados e relatados pelos pacientes, tais como:
1) falta de força por sobrecarga de trabalho;
2) começo tardio da insuficiência respiratória;
3) perda da capacidade ambulatória;
4) efeitos tardios da poliomielite;
5) Síndrome Pós-Poliomielite (SPP).
A diversidade de termos se dá devido à ausência de um teste patognomônico (específico) além de entendimento incompleto da fisiopatologia básica das novas complicações. Outra razão é que os indivíduos podem ter um, dois, ou mais processos patológicos presentes ao mesmo tempo, produzindo sintomas similares ou sobrepostos.
O termo Síndrome Pós-Poliomielite (SPP) foi cunhado inicialmente pelos próprios pacientes para descrever a variedade de sintomas inexplicáveis que causavam dificuldades físicas e psicológicas, experimentadas muitos anos após da instalação da poliomielite aguda. Com o passar do tempo o termo SPP foi adotado pelos pesquisadores incluindo não só os novos sintomas neurológicos, mas também outros problemas clínicos, ortopédicos, ou psiquiátricos que são indiretamente relacionados com as deficiências no decorrer do tempo. SPP é um termo mais heterogêneo, portanto, mais prático no cenário da clínica típica. Contudo, não deve ser usado indiscriminadamente para todas as pessoas com história de poliomielite paralítica com um novo comprometimento.
EPIDEMIOLOGIA
Segundo cálculos da Organização Mundial de Saúde (OMS) estimam existirem vinte milhões de pessoas em todo o mundo com algum grau de limitação física causada pela poliomielite.
Estudos epidemiológicos mostram que cerca de 60% dos indivíduos com sequela de poliomielite paralítica e 40% dos casos não paralíticos desenvolvem a síndrome Pós-Poliomielite.
Segundo o censo de 2010 do IBGE, existem 4.979.623 brasileiros com deficiência motora. Embora não se saiba o número de pessoas com sequelas físicas decorrentes da poliomielite, essa população necessita acompanhamento apropriado da equipe de saúde.
Abaixo, segue distribuição dos casos de sobreviventes da poliomielite em alguns países:
Local
Nº de sobreviventes
Estados Unidos da América
640.000
Canadá
50.000
Inglaterra
250.000
Alemanha
119.000
França
50.000
Suíça
20.000
Irlanda
7.500
Austrália
40.000
Japão
36.000
Brasil*
26.827
Nota: * casos notificados entre 1968 a 1989 (GT-Polio/CNDI/CENEPI/FNS/MS.1994)
Inúmeros estudos têm tentado estimar a prevalência da Síndrome Pós-Poliomielite. Entretanto, devido às diferentes definições e metodologias aplicadas em cada um destes estudos, a prevalência tem sido estimada entre 25% e 80% entre os pacientes que apresentaram poliomielite paralítica, sendo que nos casos de poliomielite tardia, a prevalência é de 82,4%.
O período de estabilidade funcional (período compreendido entre a máxima recuperação funcional após a poliomielite aguda e a nova fraqueza muscular, fadiga muscular e atrofia caracterísitca da SPP, também denominado “platô de estabilidade”) é também variável nos estudos. O menor período encontrado em estudos foi de 08 anos e o maior de 71 anos, sendo a média de 35 anos.
Entretanto, o menor período estabelecido no último consenso para os critérios diagnósticos é de 15 anos.
Estudo de seguimento com irmãos gêmeos mostrou que a instalação de nova fraqueza muscular ocorre em 71% dos casos paralíticos e em 42% dos casos não paralíticos.
FATORES DE RISCO
Em geral, uma história de poliomielite aguda grave está relacionada a um risco maior para o desenvolvimento da SPP, contudo uma parcela dos pacientes que apresentam um quadro típico dos sintomas da SPP teve história de poliomielite aguda leve com uma excelente recuperação clínica.
Alguns fatores estão associados à nova fraqueza progressiva como:
• Inicio tardio da infecção;
• História de hospitalização (decorrente da poliomielite);
• Uso de suporte ventilatório (decorrente da poliomielite);
• Envolvimento paralítico em todos os membros;
• Fraqueza intensa na época da poliomielite aguda;
• Aumento recente de peso;
• Dor muscular associada ao exercício;
• Maior idade e tempo manifestação clínica.
Alguns fatores estão associados ao início precoce da Síndrome Pós- póliomielite:
• Pacientes com formas de paralisias mais graves;
• Poliomielite aguda em idade mais avançada;
• Problemas bulbares ou respiratórios precoces ocorrem em pacientes com perda de força residual na musculatura bulbar e respiratória.
CLASSIFICAÇÕES
Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-10)
A CID é publicada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) usada mundialmente fornece códigos relativos à classificação de doenças e de uma grande variedade de sinais, sintomas, aspectos anormais, queixas, circunstâncias sociais e causas externas para ferimentos ou doenças. É sistema de codificação reconhecido oficialmente em nosso país, sendo utilizado na clínica e em pesquisas, fornecendo estrutura etiólogica.
Códigos relacionados à fase aguda da poliomielite:
CID – A80 - Poliomielite aguda;
CID – A80.0 – Poliomielite paralítica aguda associada a vírus vacinal;
CID – A80.1 – poliomielite paralítica aguda vírus selvagem importado;
CID - A80.2 - poliomielite paralítica aguda vírus selvagem indígena;
CID - A80.3 - poliomielites paralíticas agudas outras e as não especificadas;
CID – A80.4 – poliomielite aguda não paralítica;
CID – A80.9 – poliomielite aguda não especificada.
Código relacionado a SPP:
A SPP está classificada no Capítulo VI - Doenças do Sistema Nervoso Central
– Atrofias sistêmicas que afetam primariamente o sistema nervoso central.
CID – G14 – Síndrome Pós-Poliomielite
Outros Códigos realacionados à Poliomielite Aguda:
CID – Z24.0 – Necessidade de imunização contra a poliomielite Considerando-se a diferenciação entre as entidades nosológicas, o diagnóstico de Síndrome Pós-Poliomielite exclui o de Sequelas de poliomielite e Osteopatia após poliomielite e vice-versa.
Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF)
A Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF) faz parte do conjunto de classificações da Organização Mundial de Saúde (OMS). Sua última versão foi aprovada pela OMS em 2001.
A CIF é um sistema de classificação funcional que traz as dimensões das atividades (execução de tarefas ou ações por um indivíduo) e da participação (ato de se envolver em uma situação vital) de cada pessoa, bem como os qualificadores de desempenho (aquilo que o indivíduo faz no seu ambiente atual/real) e de capacidade (potencialidade ou dificuldade de realização de atividades) nas seguintes áreas:
• aprendizagem e aplicação do conhecimento;
• tarefas e demandas gerais;
• comunicação;
• mobilidade;
• cuidado pessoal;
• vida doméstica;
• relações e interações interpessoais;
• áreas principais da vida;
• vida comunitária, social e cívica.
A CIF permite a identificação de facilitadores e barreiras entre os fatores ambientais (físico, social e de atitude) peculiares a cada pessoa em diferentes momentos da vida:
• produtos e tecnologia (por exemplo: medicamentos e próteses);
• ambiente natural e mudanças ambientais feitas pelo ser humano (por exemplo: estímulos sonoros);
• apoio e relacionamentos (por exemplo: profissionais de saúde);
• atitudes (por exemplo: de membros da família imediata);
• serviços, sistemas e políticas (por exemplo: sistemas de educação e treinamento).
A utilização da CIF na classificação dos indivíduos com Síndrome Pós- Poliomielite garante aos mesmos o direito de transitar por diferentes condições funcionais, explicitando os benefícios decorrentes da assistência oferecida pelo sistema de saúde, dando destaque às ações de reabilitação. Oferece também uma alternativa factível a avaliação da qualidade dos serviços prestados às pessoas com deficiência.
Pelo exposto, estas diretrizes, em consonância com a resolução da OMS WHA54.21, que preconiza o uso dessa classificação nas pesquisas, vigilância e relatórios, prioritariamente na área de saúde pública, recomenda que os profissionais de saúde utilizem a CIF para acompanhamento do estado funcional da pessoa com SPP.
DIAGNÓSTICO
Detecção
A identificação dos pacientes pode ser feita em qualquer ponto de atenção da rede, por qualquer profissional de saúde. Para tanto, é necessário que, tanto as informações sobre o diagnóstico, quanto as informações sobre fatores de risco, classificações, avaliação clínica e possibilidades de tratamento estejam bem difundidas entre os profissionais de saúde, proporcionando uma maior resolutividade e qualidade de atendimento ao usuário com Síndrome Pós-Poliomielite.
Unidades básicas de saúde, ambulatórios, hospitais, laboratórios, centros de referência especializados em reabilitação devem estar aptos a atender o paciente com SPP, identificando os possíveis casos, prestando os primeiros cuidados ou referenciando-os aos serviços especializados.
A pessoa com sequela de poliomielite apresenta paralisia (músculo sem nenhum grau de força muscular) ou paresia (fraqueza com algum grau de força muscular), flácida (membro plégico ou parético amolecido) e atrofia assimétricas (um membro sempre é mais comprometido que o outro). Os membros inferiores geralmente são os mais comprometidos. Pela flacidez muitos pacientes usam aparelhos ortopédicos.
Na SPP a pessoa apresenta queixa de diminuição da força muscular tanto em musculatura já afetada pela poliomielite ou musculatura aparentemente não afetada. A instalação da fraqueza geralmente é lenta; a instalação abrupta pode ocorrer quando há período de imobilização.
Um aspecto a ser considerado é que algumas pessoas quando questionadas não identificam sua paralisia ou paresia com o nome “poliomielite” e sim com “paralisia infantil (PI)”.
Diagnóstico Clínico
O diagnóstico da SPP é baseado na clínica com critério de inclusão e exclusão.
Não há nenhum teste sorológico, enzimático, eletrodiagnóstico ou biópsia muscular que possa diagnosticar com certeza a SPP. Consequentemente, é essencial que se colha de cada paciente uma história minuciosa e se faça um exame físico cuidadoso junto com exames laboratoriais e radiológicos apropriados para excluir outras condições médicas, neurológicas ou circunstâncias ortopédicas que possam estar causando ou agravando os sintomas que o paciente sente.
A avaliação de um indivíduo com história de poliomielite, que está apresentando novos problemas de saúde, representa um desafio para o profissional de saúde devido ao número, complexidade e diversidade dos sintomas, a ausência de testes diagnósticos específicos, a incerteza da causa de base e a falta de medicamentos ou tratamentos curativos.
Critérios Diagnósticos
Atualmente, há dois consensos estabelecidos sobre os critérios diagnósticos: o primeiro, elaborado em 1991 e adotado pela European Federation of Neurological Societies (EFNS) é conhecido como Critérios de Halstead, já o segundo, de 2000 (último consenso), recomendado pela March of Dimes Birth Defects Foundation (Comitê de cientistas de vários países) e adotado no continente americano é conhecido como “Critérios de March of Dimes”. Os critérios podem ser observados no quadro abaixo:

Critérios Diagnósticos
European Federation of Neurologic al Societies
March of Dimes Birth Defects Foundation.
Poliomielite paralítica prévia
SIM
SIM
Período de recuperação funcional parcial ou completa após a poliomielite paralítica aguda, seguida de um intervalo de estabilidade de função neurológica
SIM
SIM
Início gradual ou súbito de nova fraqueza muscular
NÃO
SIM
Pelo menos dois dos seguintes sintomas após período de estabilidade (fadiga, dor muscular ou articular, nova fraqueza em musculatura previamente afetada ou não, intolerância ao frio, perda funcional, nova atrofia)
SIM
NÃO
Exclusão de outros problemas neurológicos, médicos e ortopédicos que possam explicar os novos sintomas
SIM
SIM
Persistência dos sintomas pelo menos por 1 ano
NÃO
SIM
Nova fraqueza neurogênica acompanhada ou não de fadiga excessiva, dor muscular, dor articular ou diminuição do endurance
SIM
NÃO

Nova Fraqueza
Neuropatia (compressão, inflamatória, infecciosa, endócrina), radiculopatias (compressão, inflamatória, infecciosa, radiação), mielopatia (compressão, estenose do canal medular, tumor, vascular);
Atrofia muscular
Desuso;
Fadiga
Anemia, câncer, cardiopatia, diabetes melito, doenças renais, doenças hepáticas, hipotiroidismo;
Dor muscular e/ou articular
Fibromialgia, paratendinite / tendinose, bursite, entesite;
Transtornos do Sono
Apneia, movimentos periódicos dos membros, hipoxemia.
Doenças neurológicas que podem apresentar sintomatologia parecida com a SPP:
Esclerose Múltipla; Acidente Vascular Cerebral; Doença de Parkinson;
Esclerose Lateral Amiotrófica; Mielopatias; Síndrome da Cauda Equina;
Síndrome de Guillain-Barré; Polirradiculoneuropatia Desmielinizante
Inflamatória Crônica (PDIC);Amiotrofia Diabética; Miastenia Grave; Miopatia
Inflamatória; Distrofia Muscular; Miopatia Metabólica.
A atrofia por desuso está intimamente relacionada a lesões traumáticas, condições clínicas graves, cirurgias e ganho de peso.
Co-morbidades:
Dentre as condições secundárias relacionadas com a poliomielite paralítica prévia que podem contribuir para uma diminuição das atividades funcionais na vida diária destacam-se:
• Escoliose;
• Hérnia de disco;
• Osteoartrose;
• Insuficiência respiratória;
• Pneumonia aspirativa;
• Disfagia;
• Desordens gastro-intestinais (refluxo);
• Desordem do trato urinário.
Determinar quais enfermidades co-existentes acompanham a doença de base é o que faz com que o tratamento tenha o devido sucesso. Sem isso, as chances de um subdiagnóstico ser eleito são muito grandes, o que leva a um subtratamento.
Exames Complementares
Exames laboratoriais e avaliações indispensáveis para a SPP:
• Geral: Hemograma Completo; Determinação de Velocidade de Hemossedimentação (VHS); Dosagem de Proteína C Reativa
• Avaliações Endócrinas: Glicemia capilar, Dosagem de T4 e Dosagem de TSH;
• Função Renal: Dosagem de Ureia, Dosagem de Creatinina e Análise de Caracteres físicos, elementos e sedimentos da Urina;
• Função Hepática: Dosagem de TGO, TGP, Gama GT, bilirrubina total e frações, determinação de tempo e atividade de pró-trombina;
• Função Cardíaca: Eletrocardiograma, Radiografia de tórax, ecocardiograma;
• Função neuromuscular: Dosagem de Creatinoquinase (CPK) e Eletroneuromiograma (ENMG);
• Avaliação nutricional / metabólica: Dosagem de ferro sérico, transferrina, ferritina, vitamina B12, colesterol, trigliceridios e frações e eletroforese de proteínas;
• Função pulmonar: Espirometria;
• Avaliação Ortopédica: Radiografia e escanometria
• Avaliação Reumatológica: Pesquisa de Anticorpos Antinucleo (FAN), Pesquisa de Fator reumatóide, Anticorpo Anti-SSA (RO), Anticorpo Anti-SSB (LA), Dosagem de Ácido Úrico;
• Estudo do Sono: Polissonografia
Solicitados de acordo com o quadro clínico apresentado:
• Biópsia de músculo;
• Ultrassom (abdome, partes moles);
 • Tomografia Computadorizada (crânio, coluna);
• Ressonância Magnética (crânio, coluna, quadril, joelhos).
AVALIAÇÃO CLÍNICA
A avaliação de pacientes com histórico de poliomielite que chega pela primeira vez na Unidade de Atendimento deve ser realizada por equipe multidisciplinar, em sete fases, a saber:
1) Triagem;
2) Avaliação multidisciplinar;
3) Exames complementares;
4) Exames subsidiários em caso de dúvida diagnóstica;
5) Confirmação diagnóstica.
6) Matriciamento
7) Acompanhamento multidisciplinar.
A coleta da História da Moléstia Atual (HMA) abrange quatro aspectos contemplados nos critérios diagnósticos:
1) História da poliomielite aguda;
2) Recuperação funcional;
3) Estabilidade funcional;
4) Novos sintomas.
ASPECTOS CLÍNICOS
Nos últimos vinte anos muita pesquisa clínica e questionários foram feitos baseados em levantamentos de indivíduos com Síndrome Pós-Poliomielite. A partir dos estudos da década de 1980 e 1990, tornou-se cada vez mais claro que há um conjunto comum de sintomas e queixas que foram frequentemente encontradas nessa população.
Os sintomas mais comuns da SPP são:
• Nova fraqueza ou aumento da fraqueza muscular;
• Fadiga;
• Dor muscular e articular;
• Novas dificuldades na realização das atividades da vida diária; particularmente tarefas relacionadas com a mobilidade.
Outros sintomas incluem:
• Intolerância ao frio;
• Disfunção respiratória;
• Alterações do sono;
• Disfagia e;
• Dificuldades na fala.
Principais sinais e sintomas dos pacientes com SPP. Casuística brasileira.
Sinais e Sintomas / clínica                                             %
Nova Fraqueza                                                          100
Ansiedade                                                                  82,9
Dor Articular                                                              79,8
Fadiga                                                                        77,5
Dor Muscular                                                             76,0
Distúrbio do Sono                                                      72,7
Intolerância ao Frio                                                    69,8
Cãibra                                                                        66,7
Desvio de coluna                                                        59,7
Aumento de Peso                                                       58,1
Fasciculação                                                              52,7
Nova Atrofia                                                              48,8
Cefaleia                                                                      48,1
Depressão                                                                  48,1
Problemas Respiratórios                                              41,1
Disfagia                                                                       20,9
Fonte: Quadros, Oliveira e Silva. 2005
Fraqueza Muscular
A nova fraqueza muscular, com ou sem atrofia associada, pode envolver os músculos previamente afetados que foram parcialmente ou inteiramente recuperados, ou os músculos que aparentemente não foram afetados pela infecção original da poliomielite. A nova fraqueza é caracteristicamente assimétrica e é frequentemente mais proeminente naqueles músculos que foram envolvidos na doença aguda e que tiveram então uma boa recuperação.
Recomenda-se observar a permanência da fraqueza por menos de um ano e a instabilidade articular principalmente em membros inferiores para diferenciar da nova fraqueza muscular.
Fadiga
Fadiga é o segundo sintoma mais frequentemente relatado como sendo o mais debilitante sintoma da SPP.
Fadiga é a sensação de exaustão e de capacidade diminuída para realizar algum trabalho físico ou mental que a princípio seria facilmente realizado.
Muitas pessoas que apresentam SPP referem-se à fadiga como uma diminuição da energia, indisposição para sair de casa, dificuldade em fazer trabalhos repetitivos, cansaço excessivo, sonolência, falta de atenção e esquecimento, podendo ser provocada ou exarcebada pela atividade física intensa e pelo estresse emocional.
A fadiga na SPP parece apresentar-se sob duas formas distintas:
Fadiga Geral (central)
A fadiga geral (central) tem sido definida como “um sentimento repentino de exaustão intensa”, uma mudança marcante no nível de energia física e disposição mental que surge após mínima atividade; é relatada como sintomas álgicos de gripe.
Geralmente, ocorre no final da tarde ou no início da noite e é tipicamente causada pelo acúmulo de pequenas atividades que não requerem muito esforço nem causam sequelas visíveis.
Sintomas que frequemente acompanham a fadiga são: fraqueza, fluxos de calor e frio, e sudorese.
Tem sido apontadas como causas que contribuem para a fadiga geral:
• Dor crônica;
• Comprometimento respiratório;
• Depressão;
• Alterações do sono;
• Disfunção do sistema reticular ativador;
• Comportamento psicológico do tipo A (conduz a vida exigindo muito de si mesmo, perfeccionista, grande realizador).
Fadiga muscular (periférica)
A fadiga muscular é referida como um declínio da força do músculo ou a falta de resistência por causa do esforço.
Os indivíduos com SPP têm descrito a fadiga muscular como “uma sensação de peso nos músculos”, “aumento da fraqueza física”, e um “aumento na perda da força durante o exercício“. A força do músculo retorna, geralmente, após um período do descanso.
As causas que contribuem para a fadiga muscular podem incluir:
• Miopatia por “overuse”;
• Desproporção do tipo de fibra muscular do músculo (fibras musculares tipo I – aeróbicas e fibras musculares tipo II – anaeróbicas);
• Função muscular defeituosa;
• Defeitos na transmissão da junção neuromuscular.
Dor
A dor nos músculos e nas articulações é o terceiro sintoma mais comum na síndrome Pós-Poliomielite.
Visando facilitar o diagnóstico e tratamento da dor, Gawne et al desenvolveram uma classificação que divide a dor em três categorias:
Dor Tipo I ou dor muscular pós- poliomielite (mialgia):
Ocorre somente nos músculos afetados pela poliomielite. É descrita como uma dor profunda no músculo ou como uma dor ardente superficial – muitos indivíduos a descrevem como similar àquela que experimentaram durante a poliomielite aguda. É caracterizada por cãibras ou fasciculações ou sensação de formigamento no músculo. Geralmente, ocorre à noite ou no fim do dia quando o indivíduo relaxa, e é exacerbada pela atividade física, estresse e por baixas temperaturas.
Dor Tipo II ou dor por excesso de uso (“overuse”):
Inclui injúrias nos tecidos moles, músculo, tendões, bursas e ligamentos, um exemplo comum, citamos a tendinite do manguito rotador, bursite subdeltoidiana e dor miofacial que ocorre mais frequentemente nos músculos da parte superior das costas e dos ombros e é caracterizada por faixas de tensão muscular e de discretos pontos gatilhos. Essa dor ocorre devido à alteração postural ou pela biomecânica alterada.
Dor Tipo III ou dor biomecânica:
É a forma típica de dor mais relatada por indivíduos com história da poliomielite paralítica. Apresenta-se nas doenças degenerativas articulares, ou nas síndromes de compressão do nervo (síndrome do túnel carpo, trauma mecânico no nervo ulnar ou no punho ou no cotovelo, radiculopatias cervical ou lombosacral).
A fraqueza nos músculos afetados pela poliomielite, a biomecânica alterada, como também a alteração do mecanismo de movimento das articulações, tornam as estruturas articulares mais suscetíveis ao desenvolvimento de doença degenerativa, especialmente as dos membros inferiores.
Está geralmente associada com atividades específicas, tais como exercício de levantamento de peso. É causada por longo tempo de microtraumas pelas forças biomecânicas anormais, como também por injúrias resultantes de quedas.
A localização da dor está frequentemente relacionada às estratégias desenvolvidas pelo indivíduo para se locomover.
Alterações do Sono
A frequência de alterações do sono em indivíduos com SPP é elevada. Esses pacientes apresentam a eficiência do sono diminuída e despertares frequentes, que podem ser devido a diversos fatores, dentre os quais podem-se citar as contrações musculares espontâneas e frequentes chamadas de movimentos periódicos dos membros. Um estudo realizado no Brasil por Quadros, Oliveira e Silva mostrou que 73% dos pacientes estudados apresentavam queixa de alterações do sono.
A apneia obstrutiva do sono (AOS), obstrução total ou parcial das vias aéreas superiores durante o sono, representa um dos principais transtornos primários do sono. As repetidas interrupções do fluxo aéreo (apneias) fazem com que haja uma diminuição da saturação de oxigênio que se corrige com o despertar do sono. As apneias obstrutivas podem ocorrer muitas vezes durante a noite, resultando em um sono fragmentado. Estes constantes despertares podem resultar em sonolência excessiva no período diurno. A AOS é também um fator de risco para a hipertensão arterial, infarto agudo do miocárdio, insuficiência cardíaca e acidente vascular cerebral (AVC). A apneia central do sono (ACS) foi relatada apenas uma vez na literatura como transtorno de sono mais frequente de pacientes com SPP. Estes apresentaram maior frequência de apneia do tipo central durante o sono não REM e tiveram a forma bulbar a poliomielite como predominante.
A hipoventilação alveolar crônica é a diminuição de fluxo aéreo na periferia da árvore brônquica, onde se situam os alvéolos, alterando as trocas gasosas.
Nos pacientes com SPP, ela é o resultado da restrição da caixa torácica provocada pela escoliose, fraqueza dos músculos respiratórios, ou ambos.
Movimentos periódicos de membros (PLM) são caracterizados por episódios de contração involuntária e repetitiva dos membros. Estudo realizado por Bruno e por Frick mostra que dois terços dos pacientes com história da poliomielite relataram que seus músculos se contraíram ou seus membros moviam-se durante a noite, sendo que 33% se queixaram de que seu sono era prejudicado pelas contrações musculares. Bruno e col. documentaram movimentos anormais durante o sono, como movimento periódico dos membros e mioclonias generalizadas ou aleatórias que prejudicavam o padrão do sono desses indivíduos.
Síndrome das pernas inquietas (SPI):
A SPI é uma condição neurológica caracterizada por uma necessidade irresistível ou urgência em movimentar as pernas associada a sensações desconfortáveis que ocorrem nos membros inferiores. Estas sensações são muitas vezes descritas como comichões, alfinetadas, formigamento ou incômodo, ocorrem em situações de repouso e predominam no período noturno, especialmente quando o indivíduo se deita para dormir. Os sintomas da SPI podem causar dificuldade para iniciar e manter o sono ocasionando insônia e consequências diurnas como cansaço, sonolência, irritabilidade, dificuldade de concentração e prejuízo na qualidade de vida.
A SPI tem prevalência estimada entre 2,5 a 15% na população geral. Pode ser primária ou estar associada a diversas condições clínicas como anemia por deficiência de ferro, gestação, insuficiência renal crônica e neuropatia. Poucos trabalhos relatam a associação da SPI com a SPP. Um estudo realizado por Marin e col. demonstrou que 35% dos indivíduos com diagnóstico de SPP apresentam sintomas de SPI de acordo com os critérios diagnósticos estabelecidos pelo Grupo Internacional de Estudos em SPI, e que os sintomas de SPI geralmente iniciam concomitantemente aos primeiros sintomas do desenvolvimento da SPP.
Vários mecanismos fisiopatológicos estão implicados no aparecimento de sintomas da SPI, entre eles, disfunção dopaminérgica, alteração no metabolismo do ferro cerebral e predisposição genética. Ainda permanece desconhecido o mecanismo pelo qual sintomas de SPI acontecem na SPP.
Intolerância ao Frio
Muitos indivíduos com história de poliomielite convivem com a dificuldade em tolerar baixas temperaturas, ou mesmo frescas ou frias. Lonnberg e Wekre e col. mostraram que a sensibilidade ou intolerância ao frio foi relatada por 46 a 62% dos pacientes com SPP. No estudo realizado no Brasil por Quadros, Oliveira e Silva em uma amostra da população de SPP, 69,8% dos indivíduos relataram maior sensibilidade ao frio. Outro estudo realizado por Maggi e col., mostrou que a distribuição topográfica da intolerância ao frio (IF) no grupo de indivíduos com sequela de pólio (SP) predominou, em 71% dos indivíduos estudados, em todos os membros acometidos pela pólio. No grupo SPP, 49% dos indivíduos relataram sentir o frio incomodar no membro mais acometido (menos funcional) e 13%, informaram maior envolvimento no membro menos acometido (mais funcional). Os sintomas associados à IF encontrados foram: Dor em 43%, diminuição da função 14%, e diminuição da força muscular 29% nos pacientes com SPP. Insuficiência Respiratória.
Os distúrbios ventilatórios na SPP afetam mais comumente, aqueles indivíduos que utilizaram ventilação mecânica na fase aguda da doença. Os sinais e sintomas da disfunção respiratória podem incluir: dispneia de esforço e/ou em repouso, dificuldade para realizar a higiene brônquica, fadiga e sonolência durante o dia, função intelectual prejudicada (incluindo dificuldade de concentração), fala entrecortada, ronco, ansiedade e cefaleia matinal. A cefaleia matinal é indicativa de hipoventilação, cursando com hipercapnia, em geral, associa-se a um maior índice de apneia-hipopneia do sono, e, PLM na SPP.
Disfagia
Disfagia é o termo usado para denominar todo transtorno de deglutição e são relatados em uma parcela dos indivíduos com SPP. Estudos de Halstead e Rossi e Lonnberg baseados em inquérito mostraram que de 6 a 22% dos indivíduos com pós-poliomielite relataram que tinham dificuldades para deglutir.
Os estudos brasileiros realizados por Oliveira e Quadros, Oliveira e Silva, 18 e 20,9% dos pacientes referiram problemas de deglutição, respectivamente.
A poliomielite bulbar aguda parece predispor o indivíduo a ter déficits na motricidade para falar e deglutir anos mais tarde. Também se tem sugerido que os novos sintomas de deglutição podem aparecer na fase tardia da poliomielite, independentemente do tipo da poliomielite aguda e se o indivíduo teve ou não os sintomas de disfagia.
Disartria
A disartria consiste no transtorno motor da fala (dificuldade de articular as palavras), sendo causada por alteração neurológica (injúria no cérebro ou nos nervos cranianos), que podem resultar em paralisia, fraqueza, ou incoordenação dos músculos dos lábios, língua, palato mole, laringe e ou do mecanismo da respiração.
As queixas de alteração motora da fala segundo Sonies em indivíduos com SPP incluem:
1) hipernasalidade (voz com som anasalado);
2) afonia intermitente;
3) diminuição do volume do som da voz;
4) rouquidão
A principal mudança na fala relatada por indivíduos com história da poliomielite é o aumento da ressonância nasal. A fala anasalada é devida ao mau contato do palato mole com a parede posterior da faringe, um pequeno “gap” no fechamento velar da parede posterior, produzindo escapamento do ar na nasofaringe durante a fala. O palato mole pode ser assimétrico ou hemiparético ou o músculo da hipofaringe pode estar enfraquecido. A fraqueza dos músculos respiratórios e os efeitos da fadiga em outros músculos frequentemente causam aumento da rouquidão, intensidade ou volume diminuído, ou perda da voz.
Transtornos Esfincterianos
A incontinência urinária (IU), caracterizada pela perda involuntária de urina pode ser classificada como IU de esforço (perda involuntária de urina sincrônica ao esforço, espirro ou tosse), IU urgência (perda involuntária de urina associada ou imediatamente precedida por urgência miccional) ou IU mista (perda involuntária de urina associada com urgência e também com esforço, espirro ou tosse) e causam grande problema social ou higiênico.
Acometem em maior número as mulheres, notando-se piora com o avançar da idade.
Bexiga neurogênica é a perda da função normal da bexiga provocada pela lesão em uma das regiões do sistema nervoso. Nas doenças neurológicas o equilíbrio das pressões ureteral e do colo vesical, esfíncter externo e tensão da musculatura pélvica, e pressão do detrusor está alterado, podendo causar uma micção incompleta ou inesperada. Ela pode ser Hipoativa (não contrátil), comumente decorrente da interrupção dos nervos que a inervam, isto é, o órgão é incapaz de contrair e é incapaz de esvaziar adequadamente ou Hiperativa (espástica), comumente decorrente da interrupção do controle normal da bexiga pela medula espinhal e pelo cérebro, esvaziando por reflexos incontroláveis.
Embora seja relativamente rara a informação de comprometimento das funções do assoalho pélvico em pacientes com SPP na literatura, podem ser observados nestes pacientes os dois tipos de bexiga neurogênica, conforme a forma de comprometimento dos moto neurônios, embora a forma espástica seja mais rara.
Os neurônios responsáveis pela inervação do assoalho pélvico são mais resistentes ao processo de neurodegeneração. Entretanto, mesmo não sendo afetados diretamente o ato de micção e de evacuação pode ser comprometido devido a fraqueza muscular de membros e a dificuldade de transferência de uma cadeira de rodas, por exemplo, para um vaso sanitário.
Embora frequentes e limitadores, os sintomas da disfunção do assoalho pélvico são pouco referidos pelos pacientes com SPP sob forma espontânea, sendo necessária a realização de uma anamnese dirigida.
Sexualidade e Intimidade
Embora a SPP não interfira diretamente na fertilidade, funções relacionadas podem ser afetadas sob forma indireta, através de diversas maneiras. Muitas medicações usadas no tratamento sintomático podem afetar a libido, a ereção e o orgasmo. A fraqueza causa problemas de mobilidade, os quais comprometem a expressão sexual. Barreiras físicas (uso de órteses, máscara respiratória) podem criar medo em lesionar o(a) companheiro(a) e inibir desejos normais. Há necessidade dos indivíduos com SPP terem um espaço adequado para colocar estas questões, seus medos e anseios em relação à sexualidade.
Questões a serem valorizadas na Avaliação Clínica
Na coleta da história da doença atual deve-se levar em conta a experiência vivida pelos pacientes com história de poliomielite paralítica e síndrome pós-poliomielite.
Os sintomas psicológicos mais observados em indivíduos com SPP são de depressão, ansiedade e estresse crônico, e que interferem diretamente na qualidade de vida.
Sabe-se que os indivíduos com história de poliomielite se deparam com a necessidade de lidar com novos sintomas, deficiências e limitações, sendo que muitos ainda não se recuperaram emocionalmente de forma total da realidade de ter tido a poliomielite muitos anos atrás. Os indivíduos com história de poliomielite relatam frequentemente que o início dos sintomas da síndrome pós-poliomielite os forçou a recordar e examinar sua experiência na poliomielite aguda.
Experiência das pessoas com poliomielite
A maioria dos indivíduos que tiveram poliomielite aguda teve nos primeiros anos de vida precisando de longas internações, isolados e submetendo-se a inúmeras cirurgias e a procedimentos médicos dolorosos. Consequentemente, ficaram separados de suas famílias e amigos, e especialmente as crianças vivenciaram esta separação com sentimentos de abandono e de desamparo.
No retorno às atividades cotidianas e sociais, após a hospitalização e reabilitação intensiva, se depararam com desafios sucessivos, não apenas por sua condição física, mas também pelas barreiras que a sociedade impõe às pessoas com deficiência e mobilidade reduzida.
Apesar disso, boa parte da população com história de poliomielite é bem sucedida em sua carreira profissional e na vida, independente, autossuficiente e produtiva, como meio de superar suas limitações, como modo de se integrar ao seu grupo social.
Reação aos novos sintomas relacionados à SPP A experiência de sentir os novos sintomas pode ser psicologicamente devastadora porque quando os sintomas da SPP surgem, abrem-se janelas de memória de um período da vida que eles acreditavam ter ficado para trás.
A reação frente aos novos sintomas é frequentemente de raiva, medo, angústia e de confusão. O sentimento de medo está presente geralmente quando o indivíduo prevê sua condição física e capacidades futuras – perda da independência, habilidades físicas e mudanças no exercício profissional.
Muitos procuraram o auxílio dos profissionais médicos por anos sem sucesso.
Devido à erradicação da poliomielite do país, poucos profissionais de saúde têm tido hoje o treinamento ou a experiência em tratar indivíduos com história de poliomielite. Muitos têm um entendimento limitado do aparecimento dos novos sintomas.
FISIOPATOLOGIA
Para melhor abordagem na avaliação clínica e consequente confirmação do diagnóstico clínico, necessário é o conhecimento da fisiopatologia da Síndrome Pós-poliomielite, e para se entender a fisiopatologia da SPP, faz-se necessário recapitular o que ocorreu durante e após a invasão do poliovírus (vírus que causa a poliomielite) no sistema nervoso central, quando ocorreu a poliomielite paralítica.
Quando o poliovírus penetra nos neurônios motores (células do Sistema Nervoso responsáveis pelo movimento), resulta num processo inflamatório que causa a morte ou danos desses neurônios.
Seguindo a morte das células do corno anterior da medula e tronco cerebral, ocorre degeneração walleriana (processo degenerativo na porção distal à lesão) e as fibras musculares associadas a esses neurônios tornam-se “órfãs” (desenervadas), resultando em alteração do padrão normal muscular, ocasionando fraqueza e atrofia muscular. A localização e o grau da paralisia dependem do local, da gravidade e da extensão da lesão neuronal.
Durante o processo de recuperação após a poliomielite paralítica aguda, os neurônios motores restantes (sobreviventes) do tronco cerebral e da medula espinhal podem elaborar novas ramificações ou brotamento axonal. Estes brotamentos podem reinervar as fibras órfãs dos músculos que foram desenervados pela infecção aguda da poliomielite, o que permite recuperação da capacidade de contração das fibras dos músculos voluntários e, assim, melhorar a força.
O processo de recuperação funcional se dá pela plasticidade neuronal (capacidade de remodelação com criação de novas sinapses), na unidade motora (composta de um neurônio motor alfa e as fibras musculares inervadas por ele). O neurônio motor sobrevivente pode se conectar às fibras musculares desenervadas, aumentando assim sua unidade motora original, formando unidade motora gigante, que permite a recuperação geralmente parcial em média 75%, mas também ocorrer a recuperação total da força muscular.
O processo de formação de unidades motoras gigantes não só permite a recuperação do quadro paralítico como também, após atingir o máximo dessa recuperação, a permanência da funcionalidade física e neuronal, processo denominado de “platô de estabilidade”. Os estudos de seguimento mostram que essa estabilidade não permanece estável indefinidamente. Após um período, em média de 30 anos, inicia-se o quadro característico da SPP, causada pela disfunção da unidade motora gigante caracterizada por nova fraqueza muscular, fadiga muscular e atrofia.
REABILITAÇÃO
Os indivíduos com SPP frequentemente experimentam um aumento cada vez maior na dificuldade de executar suas atividades diárias devido à presença de nova fraqueza, fadiga e dor. Os novos problemas ou problemas prévios que pioraram são na área de atividades relacionadas com a mobilidade (tais como deambulação, subir escadas, transferências), execução da higiene pessoal, estilo de vida e emprego. As atividades antes realizadas sem nenhum problema, agora sempre há novos desafios para os indivíduos com SPP executá-las.
Considerando-se a SPP como enfermidade crônica, multicausal, multifatorial, associada com várias comorbidades, o seu tratamento dever ser realizado de modo interdisciplinar e a partir da construção de projeto terapêutico singular.
Condições relacionadas à SPP
O tratamento da SPP inicia-se com a realização do diagnóstico. Uma vez estabelecido, as pessoas com SPP e seua familiares, devem ser orientados para que as medidas terapêuticas sejam introduzidas. As bases fundamentais terapêuticas baseiam-se em:
Mudança e aquisição de novos hábitos, com realização de atividade física sob uma forma de poupar dispêndio desnecessário de energia;
Tratamento preventivo do comprometimento das unidades motoras;
Tratamentos sintomáticos, farmacológicos e não farmacológicos juntamente com práticas integrativas (terapias alternativas) incorporados dentro de um plano de tratamento, objetivando-se melhora de muitas funções ou de alívio de sintomas limitantes.
O tratamento por equipe multidisciplinar é benéfico para todos os pacientes com história de poliomielite, sendo importante equilibrar as atividades funcionais com descanso, fazer uso correto de órtese e/ou meio auxiliar de locomoção e controlar o peso quando necessário. Isto pode contribuir para prevenir/reduzir o desenvolvimento de problemas futuros.
De uma forma geral, as principais orientações são baseadas nas queixas e sinais clínicos limitantes que o paciente apresenta, bem como nas características fisiopatológicas esperadas.
Não há, até o momento, qualquer pesquisa bem conduzida que demonstre eficácia de medicamentos no processo de neuroproteção e ou de recuperação funcional. Os medicamentos têm como objetivo principal o alívio dos sintomas limitantes.
As orientações práticas para os principais problemas que podem ocorrer no dia a dia das pessoas que apresentam SPP, têm por finalidade melhorar a qualidade de vida. Grande parte das sugestões descritas pode ser facilmente realizada, de maneira simples, não exigindo material ou equipamento sofisticado.
Essas orientações não substituem o acompanhamento com a equipe multiprofissional. Sempre que aparecerem novas queixas ou quando não houver melhora dos sintomas, o paciente deve procurar o serviço de saúde mais próximo.
O programa de intervenção para pacientes com SPP deve ser elaborado conjuntamente com a pessoa com SPP, pelo fato de que todo o indivíduo possui necessidades, metas e interesses próprios.
TRATAMENTO DA FRAQUEZA MUSCULAR DA PESSOA COM SPP
Reabilitação
A nova fraqueza ou o aumento da fraqueza muscular na SPP pode ser causado pelo excesso de treinamento, desuso ou combinação desses fatores.
Deve-se preferir os exercícios nos quais o impacto sobre as articulações são minimizados pois esse tipo de exercício trabalha a musculatura, melhorando a funcionalidade ao mesmo tempo em poupa as articulações de sobrecarga excessiva.
O paciente que apresenta nova fraqueza ou o aumento da fraqueza muscular pode se beneficiar do tratamento fisioterapêutico através de um programa de exercícios e atividades físicas terapêuticas individuais, visando a correção do alinhamento postural, tratamento da dor, mobilização articular, prescrição e treinamento no uso de órteses e meios auxiliares de locomoção.
O tratamento por meio dos exercícios terapêuticos (cinesioterapia) pode-se associar também ao uso da massoterapia e técnicas de manipulação, à eletroterapia, à termoterapia (calor ou frio) e às práticas integrativas.
Há considerável controvérsia a cerca da prescrição dos exercícios e atividades terapêuticas para pacientes com SPP. Alguns estudos de caso apontam para o aparecimento de fraqueza muscular advinda do treinamento muscular excessivo nesta população. Outros estudos afirmam que há benefícios das atividades físicas na manutenção e/ou aumento da resistência muscular e do condicionamento cardiovascular das pessoas com SPP, desde que seguindo programas de atividades físicas bem estruturadas e individualizados.
Na definição do plano terapêutico deve-se lavar em conta o grau de fraqueza e assimetria dos membros, a presença de dor, fadiga, tolerância ao exercício e desajustes posturais, bem como a condição clínica geral do paciente, atentando-se aos seus objetivos pessoais, no sentido de oferecer o tratamento de maneira segura e efetiva, aumentando os níveis de adesão ao tratamento.
A reabilitação da fraqueza deve abranger:
• exercícios de fortalecimento (isométrico, isotônico, isocinético);
• exercícios aeróbicos;
• exercícios de alongamento para diminuir ou prevenir contraturas;
• preparo para conservação de energia incluindo descanso, redução de atividades e evitar o uso excessivo;
• perda de peso;
• prescrição de órteses e meios auxiliares de locomoção.
Os casos de fraqueza muscular decorrente de desuso podem beneficiar-se de exercício de fortalecimento de baixa intensidade, não fatigante, ou exercício aeróbico de baixa intensidade.
Recomenda-se:
Força muscular
Grau ≥ 3
Exercícios objetivando ganho de força muscular podem ser benéficos, desde que usados com parcimônia.
Grau ≤ 3
Exercícios objetivando ganho de força muscular são maléficos, podendo causar danos a fibra muscular.
Estudos têm apontado que o uso muscular excessivo em pessoas com história de poliomielite paralítica tem sido a causa do aumento da fraqueza. Deve-se atentar para o aparecimento de cãibras, dores musculares, fadiga e espasmos musculares no intervalo de 24, 48 e 72 hs após o exercício e/ou atividade. O aparecimento ou piora de um dos sintomas é indicativo de supertreinamento.
Na fraqueza decorrente do treinamento excessivo crônico e fadiga, a musculatura requer descanso, devendo ser evitado o uso muscular excessivo.
Os pacientes devem ser estimulados a descansar e desenvolver atividades leves (modificação de estilo de vida).
Como auxiliares para o descanso isolado de músculos fracos, devem ser empregadas órteses adequadas. Devem ser evitadas atividades extenuantes, que produzam declínio da resistência muscular.
Entretanto, músculos afetados pela pólio apresentam atrofia por desuso. É essencial que as mudanças na resistência sejam monitoradas, após a prescrição de descanso, diminuição de atividades e órteses.
As órteses são dispositivos auxiliares destinados a suprir ou corrigir a alteração morfológica de um órgão, de um membro ou de um segmento de um membro.
Destacam-se algumas razões para a prescrição de órteses entre pacientes com SPP:
• reduzem a energia requerida para a marcha, por compensarem a fraqueza muscular;
• aumentam o equilíbrio;
• melhoram o posicionamento e a estabilidade das articulações, reduzindo a dor;
• equilibram a distribuição do peso – diminuem a sobrecarga de peso sobre a perna mais fraca, e diminuem a carga de trabalho da mais forte;
• reduzem o risco de quedas e potenciais fraturas.
Os déficits biomecânicos mais comuns, que requerem tratamento ortótico, são:
• dorsiflexão inadequada ao andar – decorrente da fraqueza dos flexores dorsais do tornozelo. Pode ser tratado com uma órtese do tornozelo ao pé;
• dorsiflexão postural colapsada;
• hiperextensão do joelho – comumente causado por fraqueza do quadríceps. A pessoa, geralmente, trava o joelho quando está andando para aumentar a estabilidade do membro inferior. Na maioria das vezes, pode ser tratada com órtese para o joelho ou, em pacientes com fraqueza mais grave, pode ser necessária uma órtese que vá do joelho ao tornozelo;
• valgo do joelho;
• instabilidade mediolateral do tornozelo.
Meios auxiliares de locomoção
Para vários pacientes com história de poliomielite, o uso, por vários anos, de muletas, cadeiras de roda manuais, e padrões de marcha assimétricos ou anormais são a maior fonte de fraqueza, dor e fadiga. Embora o paciente possa experimentar extrema dificuldade de locomoção, para ele pode ser difícil encarar mudanças ou modificações do meio de locomoção que empregam.
Muitas vezes, a prevenção das incapacidades, e a restauração da função perdida, requerem diminuição dos níveis quantitativos de marcha e de propulsão da cadeira de rodas, incluido-se cadeiras motorizadas, e mudança para métodos que não resultem em fraqueza, dor e fadiga Dentre os objetivos da prescrição de suporte para locomoção estão:
• assegurar maior estabilidade no equilíbrio e reduzir o risco de quedas;
• minimizar a fadiga e a energia exigidas para a locomoção;
• promover a melhoria da postura;
• aliviar a carga sobre as articulações.
Correção postural
O alinhamento postural fora do padrão em pacientes com história de pólio paralítica pode, muitas vezes, ser atribuído ao desequilíbrio muscular. As deformidades de postura podem levar à dor e à diminuição da eficiência energética na prática de várias atividades. O tratamento das deformidades posturais, com frequência, pode minimizar ou prevenir a dor e aumentar a resistência para sentar-se, manter-se em pé, a marcha e demais atividades.
O tratamento de deformidades de postura pode ser obtido através dos exercícios de fortalecimento e alongamento, cuidados com a coluna e uso correto mecânica corporal evitando as posturas viciosas, prescrição de orteses, adaptações e meios auxiliares de locomoção e programa para o controle do peso.
TRATAMENTO DA FADIGA MUSCULAR EM PESSOAS COM SPP
Tratamento Medicamentoso
Entre as medicações utilizadas para o controle da fadiga muscular incluem-se os antidepressivos (tricíclicos e inibidores da recaptação da serotonina) e a amantadina.
Reabilitação
O aspecto mais importante no tratamento da fadiga é o preparo do paciente para conservação de energia. A informação ao paciente sobre conceitos de atividades funcionais, descanso e simplificação do trabalho podem ajudá-lo a conservar seu condicionamento cardiopulmonar e a reduzir os sintomas da fadiga. Na possibilidade de o paciente não se adequar ao tratamento, poderá se beneficiar de outros princípios, como exercícios aeróbios.
Embora alguns pacientes possam estar sem condicionamento, a presença de fadiga constante pode impedir a prescrição de um programa de treinamento aeróbio modificado. Neste caso, a prescrição de descanso justifica-se ainda mais. Nos casos em que a fadiga não pode ser reduzida por meio de diminuição de atividade e descanso, podem ser necessárias mudanças significativas no estilo de vida como, por exemplo, as mudanças de condições de trabalho e responsabilidades domiciliares.
Em vários casos, a fadiga muscular, associada ao treinamento excessivo de grupos musculares específicos, respondem bem ao descanso localizado da musculatura e uso de órteses para oferecer proteção aos músculos e articulações. Em decorrência, pode ser necessária a prescrição ou modificação de órteses e meios auxiliares de marcha.
Desta forma, o tratamento da fadiga pode ser feito por meio do preparo para conservação de energia e mudanças no estilo de vida, perda de peso, órteses e meios auxiliares de locomoção e exercícios aeróbicos.
Para diminuição da fadiga o paciente deve ser orientado a:
programar as atividades diárias para evitar fadiga desnecessária.
Lembrar que programar as atividades também é uma forma de poupar energia;
finalizar ou concluir as atividades em períodos curtos ou dividi-las em partes, como, por exemplo, ler um capítulo do livro de cada vez;
respeitar os limites do seu corpo durante um exercício físico;
adequar o ambiente em que vive. Subir escadas, somente quando necessário e com o auxílio de corrimão;
evitar andar longas distâncias entre os cômodos da casa colocando os objetos que mais utiliza em lugares mais próximos ou ter um cão treinado para ajudar nas atividades diárias;
reservar períodos do dia somente para repousar, nem que seja por apenas alguns minutos a cada hora;
esperar que o momento de fadiga acabe para iniciar outra atividade ou fazer uma refeição. Isso evita que a fadiga piore;
evitar ficar estressado ou ansioso. O estresse e a ansiedade também pioram a fadiga;
fazer as refeições sempre no mesmo horário e em quantidade adequada para conservar a energia;
manter o hábito de dormir sempre no mesmo horário.
TRATAMENTO DA DOR MUSCULAR EM PESSOAS COM SPP
Tratamento Medicamentoso
A dor deve ser bem interpretada para uma melhor orientação. As suas causas podem ser de origem mecânica ou neuropática.
A dor de origem mecânica é a predominante, especialmente relacionada ao compromentimento articular e músculo-tendíneo. Nestas situações preconiza-se o uso de analgésicos, anti-inflamatório não hormonais e miorrelaxantes.
Estes medicamentos só devem ser usados com prescrição médica, pelo tempo necessário, respeitando-se as doses máximas e interação com outras medicações.
Quando de origem neuropática, relacionadas com comprometimento medular, radicular, ou dos nervos periféricos, o médico responsável poderá indicar medicamentos que diminuam a despolarização da membrana nervosa como antidepressivos, anticonvulsivantes e anti-arrítmicos.
Se houver persistência da dor ou se a sua intensidade for limitante, recomenda-se acompanhamento em unidade especialzada para tratamento da dor.
Reabilitação
Nos pacientes com SPP, existem vários fatores que podem levar à sensação de dor, por isso, é difícil encontrar apenas uma causa e apenas um tipo de dor.
Seu tratamento, portanto, depende da etiologia e se baseia em vários princípios, que podem ser complementados por recomendações específicas.
As principais causas de dor são: atividade física excessiva ou inadequada, estresse, cãibras e frio intenso. A dor nos músculos e nas juntas também pode ocorrer devido à mobilidade reduzida, ou seja, quando uma parte do corpo tem o seu movimento limitado e por posturas inadequadas.
O tratamento por modalidades fisioterapêuticas tradicionais pode ser útil nos casos de dor decorrente de lesão aguda. Frequentemente, mudanças no estilo de vida com redução de atividades físicas e da biomecânica empregada para a realização de determinados movimentos reduzem a dor. Essas estratégias podem ser difíceis de serem alcançadas porque, muitas vezes, exigem que o paciente desenvolva comportamentos diferentes daqueles que lhe são costumeiros. É essencial alterar o ritmo e a intensidade das atividades e aprender novas maneiras de obtenção de maior controle de quando e como as atividades podem ser realizadas. Se essas estratégias não forem incorporadas à vida da pessoa, as demais opções de tratamento podem não apresentar benefícios.
Os princípios básicos terapêuticos abrangem:
• melhoria da mecânica corporal que foge aos padrões, tais como desvios posturais e de marcha;
• alívio ou apoio para músculos e articulações enfraquecidos através do emprego de órteses e meios auxiliares de locomoção;
• promoção das mudanças de estilo de vida que conservem energia e reduzam o estresse.
Para alívio da dor o paciente deve ser orientado a:
fazer alongamento na área dolorida conforme orientação;
evitar ao máximo tudo que aumenta a dor e é desnecessário, como o medo, o cansaço, o barulho, o excesso de trabalho físico e mental;
reservar períodos de descanso ou sono;
mudar sempre de posição. Se trabalhar em local onde a necessidade de ficar muito tempo sentado, reservar alguns minutos em cada duas horas para caminhar, mesmo que dentro da própria sala;
utilizar técnicas de relaxamento, como acupuntura ou massagens;
massagear o corpo com hidratantes após o banho;
O tratamento para a dor na SPP pode exigir:
• aplicação de modalidades terapêuticas, incluindo compressas quentes e gelo;
• alongamento – para manter a flexibilidade muscular e dos tecidos conectivos;
• prescrição de órteses e meios auxiliares de locomoção;
• preparo relacionado a mudanças de estilo de vida, redução de atividade e ritmo mais lento (ver a próxima seção, sobre mudanças de estilo de vida). O tratamento relacionado ao uso excessivo de determinados grupos musculares (“overuse”) e dores causadas por fatores biomecânicos podem solicitar:
• eletroterapia (TENS, ultra-som);
• aplicação de modalidades terapêuticas, inclusive calor e gelo;
• exercícios de fortalecimento;
• mobilização articular;
• relaxamento muscular e biofeedback;
• alongamento de tendões e tecidos moles, técnicas de relaxamento miofascial;
• hidroterapia;
• modificação do padrão de uso da musculatura,como por exemplo descanso periódico;
• novo treinamento da postura e da mecânica corporal para minimizar o uso excessivo e reduzir ou evitar a dor durante as atividades diárias de vida e trabalho;
• ritmo mais lento nas atividades;
• uso de órteses e apoios para aliviar sintomas e prevenir posterior aceleração do uso excessivo de articulações e músculos, visando controle conjunto de deformidades em articulações debilitadas;
• prescrição de meios auxiliares de locomoção;
• tratamentos para fibromialgia – correção postural, medicação, exercício aeróbio;
• cirurgia.
TRATAMENTO DAS ALTERAÇÕES DO SONO
Tratamento Medicamentoso
O tratamento adequado dos distúrbios do sono, com melhora das condições de sono, tem permitido uma diminuição das manifestações relacionadas à SPP, como fraqueza muscular, fadiga e dor.
Para os quadros que evoluem com a síndrome das pernas inquietas (SPI), tanto antagonistas dopaminérgicos quanto anticonvulsivantes (principalemente quando existe dor associada) estão indicados. Nos casos onde existem os movimentos periódicos dos membros (PLM) os antagonistas dopaminérgicos respondem positivamente.
Se o indivíduo apresentar níveis de ferritina sérica menor que 50 ng/mL, indica-se a reposição com sulfato ferroso.
Tratamento com Ventilação Mecânica Não Invasiva
Os usuários com SPP que desenvolvem apneia/hipopneia podem se beneficiar da pressão positiva em vias aéras (BIPAP) através da ventilação mecânica não-invasiva (VNI).
A VNI está indicada em caso de:
sintomas diurnos (fadiga, dispneia, cefaleia matinal), associados ao aumento da PCO2 ou a redução da PO2, diurnos ou noturnos;
Apnéia obstrutiva do sono (índice de apneia e hipopneia > 15 eventos/hora)
hipoventilação noturna:
• SaO2 ≤ 88% por cinco minutos consecutivos;
• PETCO2 ≥ 50mmHg por 10% do tempo total de sono
A hipoventilação alveolar crônica é um importante fator limitante em pacientes com SPP. A hipoventilação produz hipoxia noturna, que tem sido reconhecido como fator preditor de sobrevivência, independente da fraqueza muscular respiratória. Como em outras doenças neuromusculares, a VNI tem sido reconhecida como fundamental no alívio dos sintomas respiratórios limitantes.
Em situações de diminuição da Capacidade Vital Forçada, próximo de 50% do predito, já se recomenda introdução de terapia com respirador domiciliar não invasivo. Respeitando-se a autonomia do paciente, a assistência ventilatória não invasiva poderá ser feita sob máscara com aparelho de pressão positiva em dois níveis (BiPAP). O ponto crucial da assistência ventilatória é a sua introdução precoce que permite melhorar a qualidade e uma maior expectativa de vida de pacientes com SPP.
Os ventiladores atuais são pequenos, portáteis e, relativamente, silenciosos, permitindo-se o seu uso até em atividades de vida diária, evitando-se muitas internações hospitalares ou em Unidades de Terapia Intensiva.
TRATAMENTO DA INTOLERÂNCIA AO FRIO
O tratamento da intolerância ao frio é totalmente sintomático, podendo abranger:
• múltiplas camadas de vestuário – especialmente quanto colocadas primeiramente sobre as extremidades afetadas e, depois, no restante do corpo;
• massagem (na direção distal/ proximal);
• emprego de aquecimento local por curto espaço de tempo (20 minutos ou menos) – deve ser tomado cuidados especiais quando se usa calor (aquecimento) em pessoas com sensação diminuída ou enfermidade vascular periférica.
TRATAMENTO DA INSUFICIÊNCIA RESPIRATÓRIA
A avaliação respiratória deverá constar de:
• Anamnese inicial: para compreensão da fase de acometimento inicial da doença e detecção dos sinais e sintomas de hipoventilação alveolar;
• Medidas de PI (pressão inspiratória) e PE (pressão expiratória) máximas: para avaliar a força, endurance e resistência à fadiga dos músculos respiratórios.
• Espirometria: utilizada com intuito de se determinar o tipo de distúrbio ventilatório, podendo este apresentar-se como: padrão restritivo grave (CVF < 50%), moderado (CVF entre 51 e 59%) e leve (entre o limite inferior e 60% do predito). A espirometria poderá ser realizada na posição supina e sentada. Na posição supina, em casos mais avançados com maior comprometimento do diafragma, observa-se queda da CVF de até 20 a 25%.
• Oximetria de pulso (medida do nível de oxigênio no sangue): detecta de forma precoce a hipoventilação alveolar ou comprometimento de troca gasosa. Valores de normalidade estão em torno de 95%.
• Capnografia: utiliza-se um cateter nasal para mensurar o valor do CO2 expirado.
• Escala de Borg (adaptada para dispneia): mensura o grau de esforço respiratório enfrentado pelo paciente no momento. A escala é numerada de zero a dez. Constitui-se em importante instrumento de avaliação subjetiva de esforço.
• Polissonografia: é o exame considerado padrão ouro para detecção de distúrbios respiratórios do sono e deverá ser indicada a todos os pacientes com SPP. Corrobora com a avaliação pulmonar amiúde.
• Tosse: Medida do PFT (Pico de fluxo de tosse): a tosse é o principal mecanismo de defesa pulmonar. O valor de normalidade para a população adulta é de 360 litros/min. É facilmente mensurado através de aparelho de pico de fluxo expiratório. Pacientes com queixa de disfagia de moderada à grave apresentam quedas significativas do PFT. A tosse ineficaz predispõe às infecções respiratórias devido aos riscos de  broncoaspiração.
As estratégias gerais de tratamento abrangem:
• medidas preventivas (vacina contra pneumococo e contra a gripe);
• assistência ventilatória – de preferência, com métodos não invasivos;
• identificação e tratamento do transtorno do sono relacionado à respiração;
• treino da respiração glossofaríngea e tosse;
• treinamento dos músculos da inspiração;
• alongamento e relaxamento da musculatura respiratória e acessória;
• correção postural – tratamento da escoliose
• exercícios aeróbios
• perda de peso
Dentre as técnicas empregadas, destacam-se:
• Air Stacking (empilhamento de ar);
• Respiração glossofaríngea (RGF);
• Técnica de assistência manual, mecânica ou combinada à tosse
TRATAMENTO DA DISARTRIA
O tratamento da disartria pode abranger:
• avaliação da musculatura bucal (lábios, língua, palato mole) e função motora da fala, incluindo os parâmetros de respiração, fonação, ressonância, articulação, prosódia e inteligibilidade da fala;
• aconselhamento relativo aos problemas motores na fala associados à SPP e estratégias para promoção de sua inteligibilidade. Por exemplo, emprego de sentenças mais curtas, redução do índice de fala ou evitar falar em ambientes ruidosos;
• exercícios para melhorar o som anasalado da voz, qualidade e volume da voz.
TRATAMENTO DA DISFAGIA
O tratamento da disfagia deve ser conduzido no contexto de equipe multidisciplinar especializada na avaliação, diagnóstico e tratamento de distúrbios de deglutição.
A intervenção do médico e fonoaudiólogo nos distúrbios de deglutição abrange:
• avaliação clínica e/ou radiográfica da deglutição;
• avaliação complementar da deglutição;
• orientações gerais relativas às alterações observadas, tais como:
controle de volume, ritmo de oferta, postura, tempo ideal de refeição,
evitar distratores no momento de se alimentar (TV ligada, conversas,
ambiente inadequado), observar se há presença de resíduos
alimentares na boca após deglutir (comuns na SPP) do lado
comprometido e realizar a higiene adequada a fim de evitar riscos de
aspiração (desvio do alimento para o pulmão) posterior a deglutição;
• quando indicado, realizar mudanças na consistência dos alimentos alteração da consistência dos alimentos e/ou líquidos, e fazer testes de manobras compensatórias, ou de limpeza, ou mesmo de proteção para que receba o alimento de forma segura e prazerosa;
• elaborar estratégias terapêuticas (exercícios) a fim treinar musculatura participante do processo de deglutição, minimizar alterações.
Torna-se fundamental o tratamento da disfagia, pois esta pode trazer riscos de complicações pulmonares, desidratação e desnutrição, com aumento de risco de óbito.
TRATAMENTO VISANDO A REDUÇÃO DO PESO CORPORAL
A terapia nutricional tem o objetivo de minimizar o desconforto e os transtornos causados pelo ganho ponderal apresentado em 58% desses pacientes.
A redução de peso é um meio importante e eficaz de redução da carga muscular. Na presença de dor, fadiga e fraqueza muscular, mesmo os aumentos relativamente pequenos de peso corporal podem causar efeito significativo. Para muitas pessoas com história de pólio, a perda de peso é um desafio, devido às dificuldades que enfrentam para exercitarem-se. As normas relativas à mensuração do peso corporal empregadas para o público em geral na maioria das vezes são impróprias para aqueles que tiveram poliomielite e tem um desenvolvimento músculo-esquelético prejudicado.
O ganho ponderal pode estar relacionado a vários fatores:
• aparecimento da nova fraqueza, que leva à diminuição das atividades diárias;
• conservação da energia, na tentativa de diminuir o desgaste muscular;
• depressão;
• ansiedade.
O aconselhamento nutricional é essencial para assegurar que o controle do peso seja incorporado como uma mudança permanente do estilo de vida, ao invés de ser encarado como um programa de curto prazo.
Assim, os nutricionistas buscam através da avaliação nutricional, da anamnese e do inquérito alimentar, determinar o grau de obesidade dos pacientes, adequando uma dieta equilibrada, baseada em conceitos práticos (pirâmide de alimentos), na tentativa de corrigir os erros alimentares, atingindo o equilíbrio. A esse processo denominamos de Reeducação Nutricional.
PRESERVANDO FUNÇÃO INTESTINAL
O intestino é constituído por musculatura lisa e não estriada, portanto não tendo a sua função afetada diretamente pela SPP. Entretanto, alterações na dieta, falta de exercício físico, diminuição de ingesta hídrica, alteração na consistência dos alimentos e fraqueza na musculatura abdominal podem ocasionar constipação. As principais orientações para tratá-la consistem em:
• ingesta hídrica (6-8 copos por dia);
• aumento de fibras na dieta (cereais, frutas, sementes);
• atividade física sob a melhor forma possível;
• dieta laxante;
• substâncias que podem melhorar a eliminação, tais como óleo mineral ;
• tratamento específico da constipação com fleet ou com enema.
TRATAMENTO PARA O CONTROLE DAS DISFUNÇÕES URINÁRIAS E FECAIS
Tratamento medicamentoso
No caso da bexiga Neurogênica, os agentes colinérgicos tem indicação clínica.
Já para os casos de bexiga hiperativa, deve-se optar pelos agentes anticolinérgicos e antidepressivos.
Tratamento Fisioterapêutico - Exercícios para a musculatura do Assoalho Pélvico (A.P.)
os exercícios devem ser feitos diariamente duas vezes ao dia, sendo três séries pela manhã e três à tarde;
para a realização dos exercícios recomenda-se começar com uma sustentação da contração de três segundos e quando conseguir repetir sem cansaço 10 vezes, recomenda-se passar para quatro, e depois cinco segundos e manter sempre esse tempo. Esses exercícios também ajudam as mulheres na sustentação dos seus orgãos pélvicos e na função sexual e os homens na função sexual.
Terapia Comportamental
Objetiva-se aumentar a capacidade da bexiga (armazenar um bom volume de urina), recuperando a função de reservatório, e possibilitar o treinamento da musculatura do A.P. para inibir o desejo miccional imperioso e a urgência miccional.
Essa terapia deve ser realizada constantemente, adaptando a bexiga a uma nova situação de enchimento, ao mesmo tempo em que se treina o fortalecimento da musculatura do A.P., que como todos os músculos esqueléticos, requerem um período de treinamento.
Treinamento vesical (da bexiga):
·         após acordar esvaziar a bexiga, sentar em local que possa ficar por duas horas (computador, lendo, trabalhando ou assistindo TV);
·         nesse período ingerir 200 ml ou 300 ml ou 400 ml de líquido nos primeiros 10 minutos;
·         quantificar o volume urinado e observar todos os sinais e sintomas que, eventualmente, possam aparecer (urgência, perda, obstrução, dificuldade para esvaziar, etc.);
·         anotar o volume, caso haja perda, e quantificá-la (gotas, colher de chá, colher de sopa, ½ copo, um copo ou tudo);
·         observar dia a dia se consegue aumentar o volume urinado, diminuir a urgência e melhorar a perda urinária.
Afim de evitar noctúria (levantar à noite vàrias vezes para urinar), recomenda-se restringir a ingestão hídrica após 19:00 horas.
Alimentação e função vesical (Bexiga):
Para a urgência miccional, frequência urinária diurna aumentada, noctúria e desejo imperioso de urinar, sugere-se:
Evitar
·         cerveja, leveduras em geral, bebidas gasosas (refrigerantes / champagne), vinho, bebidas alcóolicas em geral, chás, gelatinas com corantes, café (cafeína em geral);
·         abacaxi, morango, laranja, limão, feijão (a massa), tomate, queijos maduros (amarelos),condimentos e avinagrados, chocolates, carnes cruas ou defumadas;
·         cigarros.
Estimular o consumo de:
·         água mineral (sem gás), no lugar da água filtrada;
·         alimentos básicos, no lugar de ácidos;
·         café descafeinado;
·         adicionar fibras à dieta;
·         comer pequenas porções, mais vezes ao dia.
Tratando a disfunção esfincteriana
Dentre as medidas terapêuticas incluem-se:
·         medidas sócio-educativas;
·         toilete com assento mais elevado, com barras paralelas de sustentação para facilitar a transferência;
·         exercícios para o assoalho pélvico;
·         eletroestimulação, biofeedback;
·         dispositivos de oclusão uretral;
·         tratamento farmacológico;
·         cirurgia;
·         injeções intrauretrais com lisado de colágeno bovino;
Tratamento Não Farmacológico da Bexiga Hipoativa: compressão vesical externa (Manobra de Credé) e a contração dos músculos abdominais; cateterismo intermitente limpo preferível à sonda de demora.
Tratamento Não Farmacológico da Bexiga Hiperativa: restrição líquida (1,5 litro/dia); evitar álcool, cafeína e nicotina e certos fármacos que têm efeitos colaterais sobre o trato urinário, como por exemplo, os diuréticos e os α bloqueadores; treinamento vesical para readquir o controle sobre o reflexo da micção; tratamento fisioterapêutico com eletro-estimulação; cateterismo intermitente limpo.
PRÁTICAS INTEGRATIVAS E COMPLEMENTARES
Tratando-se de doença de caráter progressivo, sem medicamento que possa interromper a sua progressão, SPP deve ser encarada como enfermidade para ser tratada com práticas integrativas e complementares.
Alguns estudos tem demonstrado que paciente podem se beneficiar com as práticas integrativas e complementares para o tratamento de sintomas da síndrome pós-poliomielite.
A Medicina Tradicional Chinesa (MTC), por exemplo, dispõe de técnicas terapêuticas como a acupuntura, fitoterapia chinesa, dietoterapia, exercícios físicos e meditação. Todas se baseiam nos mesmos princípios antômicos, fisiológicos e fisiopatológicos, e visam a prevenção e cura das doenças e podem auxiliar no tratamento da dor, fadiga e intolerância ao frio.

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